quarta-feira, agosto 29, 2007

É o fim.
Ela já não fala mais, nem tenta, o corpo inchado porque o rim não funciona, fui chamada pra uma visita às pressas e me perguntei o que faria lá, já que disseram que ela também não abre os olhos.
“A médica disse que ela escuta“
Ok, se ela escuta então é outra coisa, eu vou.

Eu fui.
Ela abriu uma frestinha de olhos, a cabeça enfaixada deixava vestígios de sangue no lençól branco - ela tem feridas pelo corpo inteiro.
Respiração de quem vai morrer a qualquer minuto.

Eu, pensando em como fazê-la se sentir um pouquinho melhor (se isso for possível) durante a minha permanência, fiquei com a mão no rosto dela, olhando pra ela. Disse que a amava, e ela piscou, então eu disse que sabia que ela me ama e que isso nunca acaba, que isso vai ser eterno pra mim.

Minha irmã ficou desesperada, tagarelando, dizendo que sei lá quem mandou um beijo e que semana que vem estará finalmente livre do trabalho e que poderá vir vê-la todos os dias.
Saiu pra chorar.

Eu que não sou cardecista como minha irmã, estou tranquila, porque sei que semana que vem ela estará livre desse sofrimento todo.
Choraria se fosse ao contrário, se ela tivesse a espectativa de sofrer por mais tempo ainda. Estou aliviada, logo ela se liberta disso.

E é a vida, não é? A gente tem que morrer um dia, o dia dela chegou, com muito sacrifício. Eu chorava de pensar nela lá sozinha, sem nem poder falar pra enfermeira que precisa mudar de posição.
Não choro pela morte dela, choro por outras coisas...

Esses dias tava na mostra de curtas que tá rolando e dentro do programa “Latinos 3“ tem um curta-metragem que diz tudo (ou quase tudo) sobre eu e ela, e veja é um curta-metragem!
Assistam “Lo que trae la lluvia“ de Alejandro Fernandez Almendras - quem acha que não dá pra contar uma história em um curta é porque não viu esse curta.
É lindo!

Eu, fico aqui com minhas lembranças...

sexta-feira, agosto 24, 2007

Japonês Safado

Agora eu posso dizer, sou fascinada por Haruki Murakami, ele é definitivamente meu escritor preferido.

Me pego aos prantos no final dos livros, não consigo parar de ler, varo a noite, vou podre pro trabalho, esqueço que a Rúcula acabou (e isso é muito, muito grave) porque estou lendo algum livro dele.
Fico aérea, ele me pega com a mão e me tira da órbita. Tive que parar o último livro que lia (Minha Querida Sputinik) porque me atrapalhava no trabalho.

Eu já li três livros dele e estou desesperada por mais um.

Durante o livro todo não existe sequer uma página em que ele não me ensine ou me lembre de algo importante que eu não devo esquecer.

Sempre tem algo trágico, suicídios, desaparecimentos e afins, mas não se trata disso, não é pelo fato em si que fico assim como estou agora, com vontade de sair por aí gritando e me esvair de chorar pra ver se passa o que esse filho da puta fez entrar em erupção aqui dentro - ele é um grande filho da puta.
Não fico assim emocionada por qualquer identificação com a perda em si mas pela forma como o narrador redescobre o mundo e passa esse luto. E o luto não termina, o livro acaba e o luto fica - em você.

Pela forma como ele define e te joga na cara a solidão inerente à cada ser humano. Como ele te diz: “Toma, olha aqui o seu vazio, ele é seu e só seu e ninguém nesse mundo pode fazer nada por isso, você é quem tem que dar conta dele.“
E o mais foda é que ele consegue dizer isso da forma mais sutil e bonita.

Sei lá, tem coisas que mexem comigo de verdade, e o que esse cara escreve é sempre assim, causa vários graus na escala Richter dentro de mim.
Teve uma época que eu dava pra qualquer um que me desse tesão, qualquer um.
Se a pessoa não falasse muito, tanto melhor, eu só queria sexo, pra que falar?
Mas nem nessa época eu media músculos ou cinturas.
Eu mudei muito, é bem verdade, mas tesão sempre foi muito mais que um corpo inchado de academia.

Tenho um certo asco toda vez que passo em frente a alguma academia, ainda mais quando ela é aberta e posso sentir aquele cheiro de vários corpos suando pra conseguir uma barriga horrível de tanquinho.
Hught!

Aliás, minha humilde opinião estética é que a academia acaba com a beleza dos corpos - e das mentes, ainda mais quando as mentes já não são assim tão belas...

Tenho uma conhecida que defende a academia porque quando velha, com 80 anos, quer ser dessas ativas e descoladas que tingem o cabelo e correm às seis da manhã.

Daí eu fico aqui “rezando“ pra se eu chegar aos 80 anos, ou mesmo aos 50, ser dessas que ainda pensam.

quinta-feira, agosto 23, 2007

Oito da noite

Ontem, um animal tentou roubar meu celular, um animal fêmea, ela rosnou pra mim e com toda força tentou arrancar o celular da minha mão.
Achei que ela ia me morder.
Achei que ela tinha me mordido.
Puxou, eu puxei de volta, ela puxou com mais força, eu puxei de volta e quando ela se deu por vencida, depois do meu imenso grito de horror (desses que acho que só dei em pesadelos) e saiu correndo, algumas pessoas estavam imóveis à minha volta, meio chocadas, mas não fizeram nada, paralizados.
Depois de uns segundos voltaram a se mover e eu notei que ela não estava sozinha, andava com outra que vinha atrás.
As pessoas passavam e os Mackenzistas riam à minha volta, sem perceber ou sem se importar com o acontecido.
Mais à frente do outro lado da rua, um adolescente cabulando aula no bar, gritou e estendeu um papel que dizia: SOS CERVEJA
Eu que já estava assustada estiquei meu chute karatê na altura do rosto dele. Por sorte (dele) me toquei que não precisava chutar um Mackenzista bêbado, ele não queria me roubar.
Ele é só mais um dos milhares de idiotas que frequentam aquela “escola“.

Meu maior medo é que de madrugada quando volto pra casa e passo por lá, não tem gente pra ouvir meu grito.

sábado, agosto 18, 2007

Não me conheço, provavelmente não sou quase nada do que acho que sou, assim como vejo tanta gente dizer que faz aquilo e isso e provavelmente não faz nada daquilo que acha que faz e não é nada daquilo que acha que é.
A maior parte das pessoas prefere destruir qualquer coisa na impossibilidade de contruir alguma.
Uma vez eu cortei a goiabeira, peguei uma faca e cortei a goiabeira com vários talhos. Acho que aquela árvore era a coisa que eu mais amava naquela época, ela me ouvia sem mandar eu me calar, e meu avô tinha posto um balanço nela e eu ficava os dias inteiros me balançando. No caule retorcido eu montei minha cozinha com meu fogãozinho vermelho. Eu a abraçava e cantava, e ela me segurava no colo dela.
Nesse dia, sem motivos aparentes eu cortei a goiabeira e a fiz sangrar seiva verde e quebrei meu fogãozinho vermelho, desmontei toda a cozinha e nunca mais tive coragem de ir lá brincar com ela.
A terra é um lugar escuro e a luz do sol me queima como um ácido ao invés de fazer crescer minhas flores.

segunda-feira, agosto 13, 2007

Eu olho o lago negro
do lado negro
e gostaria
mas não sei fazer poemas

Odeio quando os sentimentos se misturam assim, quando chego a esse ponto de não saber mais o quê e quero escrever um poema pra ver se sai essa coisa do meu peito - e porque sinto tanto??
Do nó na garganta ficar tão apertado que não consigo ler o guia da semana.
Dos dias com gosto de queimado porque me esqueci de desligar o forno que gratinava minha vida.

Nesses dias eu odeio muitas coisas...
E não paro de pensar porque as pessoas usam salto e channel nº 5, ou porque gostam de cheddar, ou porque pagam fortunas num carro e correm bêbados por aí.
Vocifero contra o mundo, como se isso fosse mudar alguma coisa dentro de mim.
E vem uma amargura do tamanho de um navio feito em cinzas dentro do meu peito.

E continuo sem entender a amargura: um sentimento tão ruim e começa com “amar“.
Ainda sou tão criança nesta vida...

Talvez eu devesse virar alpinista.

Alcoholic Jobless

Sem emprego, de novo.
Hoje vou lá me demitir. Se for pra ser explorada pelo menos que seja numa cozinha onde aprendo. É uma necessidade minha, aprender, aprender tudo o que conseguir, e lá estou estacionada, já.

Eu sou alcoolatra, é um fato. Não me controlo, sempre quero a saideira, sempre, e ela nunca acaba se depender de mim, sempre vem outra, e outra... É difícil assumir, mas sou do tipo A.A. Meu cérebro é uma metralhadora, quando aciono o gatilho dispara várias balas, quer beber e beber e pra tirar o dedo do gatilho é difícil. No dia seguinte é sempre a mesma merda, assim como agora, like a shit.

Quando eu não tenho emprego, quando tenho que me levantar pra procurar mais uma cozinha pra ser explorada, escolher mais um lugar desses e implorar pra ser contratada pra ganhar 500 reais, é mais difícil ainda de tirar o dedo de lá.

Agora tenho que ir pro banho e depois ir até um desses restaurantes falar com um chef que eu sei que é um merda, mas que pelo menos tem alguma coisa pra me ensinar - eles sempre têm alguma coisa - porque aprendeu com uma super cozinheira que admiro muito. Se entrar eu sei que é no máximo dois meses e hasta luego! Mas eu vou mesmo assim.

Fiquei pensando no que um amigo do Rodrigo me disse, ele ficou meses desempregado e acabou arranjando uma forma de viver sem precisar de um emprego - enquanto ele dizia isso fiquei pensando que me mandaria fazer maria-mole pra vender no farol (não estou longe disso). No caso dele, hoje, vive de música, sem outro emprego pra sustentar, faz trilhas sonoras com mais dois caras e consegue pagar as contas.

Fico aqui pensando o que eu poderia fazer de alternativo pra conseguir sobreviver, já que viver com o que ganho estou longe de conseguir.

Estacionar carros na rua, talvez consiga mais que três reais por hora de trabalho, e sem os descontos!

quarta-feira, agosto 08, 2007

Rotavírus

Hoje eu fui no PS da Santa Casa atrás de uma hálibe.
Nem sei há quanto tempo não fazia isso.
Ser mais uma a atrapalhar no PS por um atestado, sem doença alguma, enquanto pessoas que realmente precisam esperam.
Bem, eu tinha uma cólica menstrual dos infernos e uma náusea que não sei se era de pensar em ter que ir trabalhar ou se tinha relação com meus problemas femininos. Talvez, os dois.

No fim, acabei lá, e enquanto tentava fazer o cadastro pra passar pela triagem passou o Picanha com uma receita na mão.
Chamei, ele passou reto, e depois de uns 15 segundos voltou e me cumprimentou.
_ Oi tudo bem?
Obviamente eu não estava bem, mesmo não estando tão mal pra estar lá.
_ Tudo mais ou menos e você?
_ Ah, é só o Rotavírus, já tô ficando bom!
_ Ah, melhoras pra você então...
_ Pra você também.
Antes dele ir pro final da fila que ficava uns 20 minutos depois de mim, um boliviano segurou o braço dele que segurava a receita, e disse:
_ Tomó medicación?
_ Si, si...
_ Consultado por el médico?
_ Si, si, si...
E foi pro final da fila com seu Rotavirus, como se ele fosse o novo mascote.

domingo, agosto 05, 2007

Eu tive um namoradinho que estudava agronomia, 18 anos, queria salvar o mundo da fome. Tinha um projeto de criar uma planta que cresce no oceano e dá um fruto comestível e ultra nutritivo com o qual as nações miseráveis poderiam ser abastecidas - ninguém mais brigaria por terras e assim o mundo seria salvo da miséria.
Ele levava isso à sério, tão à sério que se embrenhava por meses no meio do mato com projetos sociais em comunidades ribeirinhas e afins.

Obviamente nós não ficamos juntos muito tempo por uma série de divergências. Terminei de vez o relacionamento quando ele apareceu uns 15 quilos mais magro na minha casa com cara de louco dizendo que não deveria mais comer porque outras pessoas precisavam muito mais de comida que ele que tinha boa estrutura física e era bem nutrido.

Eu não sou tão megalomaníaca a ponto de achar que vou salvar o mundo de algum mal, até porque é uma questão de inteligência perceber que ele já está fodido mesmo e não há muito o que fazer.

Mas meus braços são muito longos às vezes.
Sou capaz de abraçar uma cozinha inteira se for preciso.

E trabalho, trabalho trabalho, e nunca sei dizer não posso, não consigo, não tenho tempo pra isso, não dá...
Eu corro, corro, nado, nado e nado no meu próprio suor pra ver se consigo merecer alguma coisa nesta vida.

Entro de cabeça e não me importo com as consequências porque eu amo a cozinha pra começo de conversa. Eu amo aquilo tudo, descobri que amo até as cozinhas sujas, com aquele chão parecido com banheiro de acampamento - não sei o que me deu, sempre odiei cozinhas sujas. Cada vez estou pior com esse amor doente!

Isso tudo só pode ser uma doença, porque no fim, meu mérito não existe. Uma mina tosca, atrevida, prepotente e arrogante (tudo que você não deve ser na vida e muito menos numa cozinha) foi contratada pro cargo que deveria ser meu pelo meu esforço e bom desempenho fazendo o trabalho de três pessoas durante o último mês.

Mérito, nessa vida, não existe!
Você tem que chegar com um diplominha que o papai pagou do Senac ou da Anhembi Morumbi e uma maleta no estilo James Bond com um equipamento que você nunca vai usar numa praça fria pra mostrar que você é bom... Só mostrar, porque ser bom mesmo, não interessa muito.

No fim acho que não sou muito diferente daquele menino, eu me fodo do mesmo jeito e provavelmente não vou conseguir chegar onde quero.

sexta-feira, agosto 03, 2007

Rodrigo está no banheiro, e como sempre aproveito a deixa pra sentar aqui e escrever qualquer coisa.
Sinto que a porta que nos divide não diferencia muito o que fazemos.

Na verdade, eu vivo em um ambiente de merda, difícil seria que eu ficasse límpida dessa grande bosta que é um restaurante.
Donos ditadores e maleducados, metade dos funcionários estão lá pela mais pura necessidade e o resto que poderia ser alguma coisa, são só puxa-sacos de plantão com conversinhas de maricotinha-foi-na-academia.

O porteiro me diz sempre algo sobre o clima quando adentro o edifício todas as noites, cansada, rezando pro elevador estar no térreo - primeiro pra eu não ter que sentar na escada esperando o elevador e depois pra encurtar a conversa: “Tá entrando um vento frio, hein? Será que vai esfriar de novo?“
É sempre alguma pergunta ou informação sobre massas de ar, brisas ou graus Célcius.
Deve ser difícil ser porteiro, sempre ter que arranjar uma frase diferente pra única viv´alma (sempre mais morta que viva) que passa acordando você do seu cochilo em horário de trabalho.

Eu sempre brinco com o ajudante geral lá do restaurante que só sabe procastinar, digo que ele se daria melhor como porteiro.

A vida é assim, quem não consegue conversar sobre vento sul acaba na pia de algum restaurante.

quarta-feira, agosto 01, 2007

De bundas e banhos

Assustei com uma busca no Google, dizia: “meu avô me comeu a bundinha“

O pior é que o sujeito vem direito pra cá, na primeira página de busca.
Medo!

Outro medo:
Rodrigo pergunta quando foi a última vez que tomei banho e eu olho pra cima tentando lembrar, mas não sei dizer.
O chuveiro não esquenta nem por decreto!
Me falta coragem até pra sentar naquela privada gelada, ando fazendo xixi em pé na minha própria casa.

Esse apartamento é muito gelado, eu preciso de um aquecedor.