quinta-feira, setembro 20, 2007

Semi Deuses

Eu sou a rainha da resistência baixa, fico triste e pumba, tenho que correr pro P.S. com alguma infecção. Dessa vez é na bexiga, e dói, dói de verdade.
Ando pela casa parecendo mulher pós-cesariana passeando pelo corredor da maternidade.

Tive que ir à dois Pronto Socorros até conseguir um diagnóstico e uma receita com a medicação certa pra aplacar a infecção.

Na segunda-feira eu já sentia um desânimo do tamanho de um bonde enferrujado encostado num ferro velho e uma dor na região do baixo ventre, pensei que se tratava de algo relacionado à ginecologia, fui ao Hospital da Mulher no Perola Byton. Mas antes liguei pra me certificar se eles poderiam me atender, contei pra atendente o que sentia e ela disse que eu poderia ir lá.

Chegando lá a médica me pergunta se tenho câncer.
Eu respondi que esperava sinceramente que não fosse esse meu caso.
Ela, de voz elevada, me informou que aquele hospital trata de mulheres com câncer ginecológico e que se esse não era o meu caso, não tinha porque estar lá. Ainda pegou minha ficha e, elevando mais ainda a voz, disse que eu morava do lado da Santa Casa e que deveria me tratar lá, repetiu aquilo tudo umas três vezes.
Me perguntou quando fiz o último Papa Nicolau.
_Há dois anos, porque estou sem convênio médico - respondi.

Pronto, mais um xilique...
Ela dizia que ficar sem convênio médico não é desculpa pra não fazer consultas médicas, que toda hora tem mutirões de Papa Nicolau, exame de vista e essas coisas que temos que fazer periódicamente.
_A saúde pública não é assim tão terrível quanto pintam por aí, é só se ligar! - dizia ela, exaltada.

Então gentilmente e de voz calma eu perguntei onde é que eu poderia me informar desse tipo de serviço prestado.

_Ah, tem toda hora por aí... - disse ela mais calma.

_Por aí onde?

_Por aí, por aí... tem... tem cartazes em muros... e já teve dois no último ano, mas ninguém vai, fica vazio o lugar e depois ficam chorando que saúde pública é uma merda...

_Quais muros?

_ Muros, muros... por aí... e sempre tem chamadas na tv também! - começou a se exaltar de novo, repetiu que não era desculpa pra eu não ter feito Papa Nicolau.

Então eu percebi o quanto era inútil dizer aquela criatura que se acha um semi-deus que eu não tenho uma fabulosa e incrível televisão, e que mesmo que tivesse, eu sei que esse tipo de publicidade não chega nas emissoras, que no máximo aparece no jornal do meio-dia que está tendo um mutirão de sei lá que porra até as quatro da tarde na Vila Nova Inhocumé.

Além do mais, eu nunca assistiria ao jornal do meio-dia e nem a nenhum jornal, nem programa algum da tv aberta porque eu morro de vergonha das caras e bocas dos apresentadores e atores de tv, vergonha das notícias medíocres, das canalhices e das maracutaias governamentais...

Enfim, nem ousei dizer a verdade: eu tenho um aparelho de TV em casa, vinte e tantas polegadas, lindo. Ganhei. Mas não o ligo nem se me colocarem no pau de arara!

Ela ia acabar exercendo o poder dela de semi-deusa me dando uma injeção letal se eu ainda dissesse que sei bem onde ficam os muros com os cartazes informando esse tipo de serviço... que ficam dentro dos hospitais públicos e por isso ela pode listar tantos mutirões do caralho a quatro que teve no último ano.

Não disse nada, apenas concluí que ela é uma coitada mal comida na TPM e infeliz com o trabalho.

Eu também seria imensamente infeliz se tivesse estudado anos só pra olhar bucetas fedidas e cancerosas todos os dias da minha vida, horas a fio.