quinta-feira, julho 26, 2007

Pé de chinelo

Eu tinha um chinelo desses de vó, era bege, peludo e bem quentinho.

Tinha, já que logo que Bisteca chegou há seis meses, começou roendo o chinelo esquerdo pelo calcanhar. Eu repreendi, mas foram tantas vezes até ela aprender que não podia pegar o chinelo que de 39 ele virou 35.

Continuei usando o chinelo com aquela desculpa “tenho que comprar outro antes de jogar esse fora“. E fui usando até que já tinha me esquecido disso, só me lembrava nos dias bem frios quando meu pé ficava gelado.

Hoje, ela resolveu pegar de novo o chinelo. Fez uma mágica canina e conseguiu puxar o maldito chinelo pelo vão da porta trancada do quarto, e ao chegar do trabalho o circo estava armado: o pé esquerdo já era tecido e borracha em pedaços sobre o sofá da sala, sobrou um pé direito 37 - ela começou a roer pelo calcanhar também.

Agora o estômago dela parece que fala, e alto.

terça-feira, julho 24, 2007

There are hard things too

Deitada no seu peito fiquei ouvindo seu coração bater, naquele mar de tranquilidade e prazer acabei nervosa, pensando no dia em que ele vai parar. E você me pegou e me beijou o melhor dos beijos me distraindo dos pensamentos, mas sinto que precisava muito pensar naquela hora que queria que ele parasse só depois do meu.

Por favor.

sexta-feira, julho 20, 2007

Ontem apareceu uma menina de 19 anos no restaurante pra fazer um teste na cozinha. Era a primeira cozinha que ela entrava na vida, só tinha ido à cozinha-escola da FMU, onde provavelmente só cozinhou ovo em um grupo de dez pessoas, já que está no primeiro semestre de curso.
A cara dela era de dar dó, demostrava um espanto terrível, nem fugindo de assaltante eu fico com aquela cara.
Pobre alma, talvez hoje ela não tenha ido à faculdade.

quinta-feira, julho 19, 2007

Vou tatuar na testa em letras bem modernas um “panaca“
É isso que eu sou, uma panaca.

Eu pedi pra começar a trabalhar uma hora mais cedo e minha chef concordou.
Queria tanto um pouquinho mais de tempo pra ler “Minha Querida Sputinik“, nada.
Pior, agora não posso nem mais pegar a sessão das 14 hs.
Começar a escrever sobre gastronomia no blog que entrei (e não dei as caras ainda), muito menos.

Ah Darvin, porque existem pessoas tão idiotas neste mundo?
Melhor, porque eu sou uma dessas pessoas tão idiotas?
Porque eu me lasco pelo restaurante dos outros?

Me sinto mal pra caramba porque minha praça estava uma zona por um erro de escala e dos outros funcionários e agora, eu peço pra entrar mais cedo pra deixar a praça inteira pro movimento.

Eu tenho que aceitar minhas limitações e erros, entender que todo mundo erra, e porra, eu também tenho o direito de errar!

Mas meus erros dóem em mim, e eu quero diminuir ao zero a possibilidade de errar, então entro uma hora mais cedo.

P A N A C A!

segunda-feira, julho 16, 2007

Morrer não é nada

Queria ajeitar o lençól com a mão e não conseguia, a mão muito trêmula e sem força pra levantar a dobrinha do lençól. Daí ela começou a gemer, era mais um grito que terminava quando o fôlego acabava e voltava com a respiração de alguém ofegante.

Eu falava com ela, mas ela só queria gritar mesmo, continuamente.
Eu perguntei se tava doendo, se ela queria que eu chamasse alguém, ela fechava os olhos querendo dizer não - minha família nunca vai acreditar mas eu sei quando ela quer dizer sim ou não. Eu perguntei se ela queria alguma coisa das enfermeiras, insisti, disse que ia chamar alguém, ela disse que não.

Ela gritava com a voz que já é tão fraca que nem se percebe muito - lembrei de um pesadelo que sempre tenho, quero me virar na cama e não consigo, e aí tento gritar pra acordar a mim mesma e me mexer, mas a voz não sai e fico paralizada.

Me acalmei, respirei fundo e olhei bem nos olhos dela pra tentar entender e percebi, era medo.
Então eu perguntei “você tá com medo?“ e ela deu um aceno com a cabeça, bem grande, com um resto de forças.
E eu sem saber o que dizer, disse que não precisava ter medo, que ia ficar tudo bem, e fiquei repetindo, abraçando ela do jeito que podia...

O corpo dela quase já não existe. A impressão que dá é que ela vai voltar a ser um feto, as pernas sempre dobradas, ela não se estica mais. Passei a mão na cabeça dela até ela se acalmar.

No final, contei que minha cadela tinha comido o guarda-chuva e eu sem perceber saí com ele e só saquei que ele tava comido depois que abrir e vi os furos na rua quando precisei dele. Ela sorriu e balbuciou um “só podia ser contigo!“ e eu sorri também. Quando o sorriso foi embora eu falei que ia esfriar e que precisava ir pra casa, e precisava mesmo. Precisava chorar muito, as lágrimas escorriam lá, mas eu ainda sorria e ela sorria de volta.

Agradeci as enfermeiras que estavam por lá e uma delas disse “vai com deus“ e uma fúria me veio... Que Deus é esse que quer que ela viva assim? Porque podemos sacrificar animais com doenças terminais mas os humanos, com consciência, têm que ficar sofrendo? Aquilo é um depósito de restos humanos.

Lá fora, chorei mais do que caía água do céu. Fiquei em baixo do meu guarda-chuva furado olhando as roseiras do jardim entre as águas...

quinta-feira, julho 12, 2007

Toda quinta-feira é assim: ele me liga quando já estou de volta no ônibus emaranhada em milhares de pensamentos e pergunta se estou bem. A resposta é sempre a mesma: Não... hoje foi dia de terapia, né?!

Me pergunto porque a vendedora da loja tenta me vender um pijama com o argumento “fica lindo!“ Porque um pijama haveria de ficar lindo? Eu vou dormir com ele, ele tem que ser confortável!

Rodrigo me oferece cera quente pra “depilar“ melhor a mexerica. Me lembro de um ex-namorado que tirava todas as pelinhas do gomo da mexerica e me dava na boca porque eu não comia de outra forma e ele se preocupava com minha alimentação. Acho que só por ter feito isso por quase dois anos eu deveria tê-lo odiado menos depois dele ter terminado comigo. É que a gente tem que odiar as pessoas que nos penabundeiam - inspirada em Reinaldão (só li “Tanto Faz“ mas já fiquei íntima).

E depois de tanto enrolar, o assunto: existem formas de terapia que podem me ajudar a perdoar a minha mãe e mudar a minha visão trágica da minha causa mortis.

Preciso me lembrar disso, por isso publico.

quarta-feira, julho 11, 2007

Lebre e lobo

Toda vez que eu me deparo com essa coisa assustadora que é a morte, a perda de alguém que eu amo, eu viro uma boa presa.
A vida me come a hora que quiser, eu ando lenta nesses dias...
Meu avô sempre fazia picles pra mim, eram deliciosos.
Quando ele morreu, tinham três vidros grandes na geladeira.
Eu chorei comendo aqueles picles por meses, economizava no sanduíche pra durar mais tempo.
Guardei o último vidro lá, e não deixei ninguém mexer, até que meu pai sentenciou: “isso vai estragar!“
Tive que comer o último pedaço de vida dele, chorei muito, era o fim da sensação de que ele ainda ia me ligar perguntando como foi meu dia depois do meu sanduíche.

Hoje eu só como picles Hemmer.

segunda-feira, julho 09, 2007

Hoje, meu dia de folga, fui visitar minha tia-avó que me criou num hospital geriátrico no Jaçanã - pra usar o eufemismo, porque lá é um asilo e eu me sinto uma cretina de só ter folgas às segundas-feiras pra ir visitá-la.

A vida é urgente, eu corro pro trabalho, venho pra casa, escrevo aqui, coloco comida pra Bisteca, vou passear com ela, passo aspirador no quarto, lavo meu uniforme, tiro a mesa do café da manhã, bebo uma cerveja... ou seja, não faço muita coisa da vida. E ela está lá, com uma doença degenerativa, dividindo o quarto com uma senhora que tem alzheimer e que fica gritando.

Na semana passada ela deu o maior sorriso do mundo quando me viu, perguntou do meu marido “um moço tão bonito“ e lembrou até da minha cadela - as pessoas da família dizem que ela não se lembra de nada e a tratam como demente. A linha da memória dela é intermitente mas ela se lembra das coisas pelo menos metade do tempo.
Na hora de ir embora ela me pediu pra levá-la pra casa, eu tive que dizer que ela ainda não estava bem pra sair do hospital.
Na volta, dentro do ônibus, fiquei pensando que queria dizer pra ela algumas coisas do nosso passado, porque agora, é só o passado que ela tem. E o meu passado com ela não foi assim tão ruim...

Uma vez eu fui correndo pra dentro do mar atrás da minha bola branca de pintas vermelhas e caí num buraco, e ela correu atrás de mim de roupa, óculos e tudo. Eu tinha só três anos mas me lembro bem de abrir os olhos embaixo da água e vê-la com cara de desesperada com os óculos tortos arregalando os olhos tentando nadar sem saber na minha direção. Por sorte um caiçara que passava viu tudo e nos tirou do buraco sem ninguém precisar ser ressussitado, só bebemos uma aguinha do mar e tudo bem, naquela época o mar do Litoral Norte era limpo.

Ela sempre foi desesperada e me criou como uma boneca de porcelana rara, uma jóia que precisava ser guardada de todos os males do mundo. Acho que se ela pudesse até mesmo hoje, me enfiaria em uma bolha já que o ar anda tão poluído.

Eu tinha muitos ressentimentos, sempre achei que ela nunca entenderia que eu posso ser feliz do meu jeito até um dia em que fui vê-la quando ela ainda estava em casa e ela me perguntou se eu era feliz, e eu respondi que sim, ela disse “tiras um peso muito grande do meu coração“, e isso me pareceu mais com uma despedida do que uma reconciliação.

Hoje ela não abriu os olhos pra ver a gente, e eu tenho muito medo dela não poder mais abrir os olhos e falar mas ainda ter a consciência dela.

sexta-feira, julho 06, 2007

Meu nome é Carolina Helena e o que segue felizmente não é: “e faz três dias que não bebo“.

Por mais brega, esse é meu nome e eu gosto dele, não assino aqui porque me escondo. Não queria que algumas pessoas achassem o blog, mas parece que não adianta, alguém comentou me chamando assim e agora tem buscas no Google. Tudo bem, já é hora de assumir.

É isso aí, meu nome é Carolina e meu sobrenome é Helena.
O sobrenome que meu pai deu, eu já dispensei há tempos, o da minha mãe, também não quero, obrigada.

Muitas vezes pensei naquele clichê de ter sido trocada na maternidade, mas no fim sou só torta mesmo, ainda bem, nasci diferente de todos eles e não quero nome nenhum.

Sem ressentimentos, eu tenho o meu, eu sou Helena, Carol Helena, muito prazer!

quarta-feira, julho 04, 2007

As vezes antes de dormir eu me lembro de algum sonho que eu nunca sei se é sonho ou se aconteceu de verdade.
Ontem eu me lembrei de pular muros altos que dividiam quadrados de terra cheios de dejetos, me lembro do sufocamento e que eu seguia um homem rude que me guiava. Se foi sonho ou realidade aconteceu há anos.
Às vezes eu sinto que existem outros eus que vivem em diferentes lugares, e que essa é só uma forma de mundo e de eu.

terça-feira, julho 03, 2007

Aos que vem aqui e não vão lá...

Hoje é o último dia.
Não percam!

ANÁLISE COMPORTAMENTAL E CRÍTICA DA MÚSICA EDUARDO E MÔNICA

Texto

Adolar Gangorra

Adaptação, Direção, Sonoplastia e Iluminação

Fernanda D´Umbra

Com

Fábio Espósito, Pablo Perosa e Fernanda D´Umbra

Hoje - às 21h30

No Espaço Parlapatões - Praça Roosevelt, 158 - Fone: 2163.2000

Ingresso: R$10,00


E depois me lembrem da sigla que por vezes quero falar e me esqueci.
Hoje eu trabalho até a 1:30 da manhã.

segunda-feira, julho 02, 2007

Lavorare

Trabalho salva.

Essa semana a sacola daquele cara estranho no metrô não tinha uma bomba caseira, meu prédio não estava em chamas quando cheguei e eu não fiquei viúva e sozinha no mundo.

Dentro da cozinha eu saio de dentro do olho do furacão.